sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Uma receita de amor...

certamente.


Faz tempo que não entro aqui pra deixar alguma receita. É que 2011 quis se esticar um pouquinho e fiquei meio enrolada nele.
Eu teria um monte de receitas pra postar que fiz no Natal,Ano Novo e pelas semanas que se passaram... Só que elas são receitas com medidas, ingredientes e, principalmente, TEMPO.
A gente é um retalho de momentos vivenciados,  na verdade é resultado deles, da forma como vivemos os acontecimentos. Eu tenho um tio, tio Ed, que está na minha vida desde sempre. Morou conosco quando eu nasci em Uruguaiana/RS, depois nos mudamos para o Rio de Janeiro, eu tinha 8 anos. Quando meu tio se casou foi morar no Rio também e ficou morando conosco até arrumar um apartamento. Nessa época eu e meu irmão do meio fingíamos que tínhamos dormido no sofá pra ele nos carregar pras camas !! rsrsrs Quando ele alugou um apartamento foi no mesmo prédio em que morávamos, foi tudo de bom !! Ele foi buscar a esposa, Beatriz, chamada por todos por tia Branca. Minha mãe era filha de alemães e ela aquela italiana calorosa e, acreditem ou não, silenciosa !! É de um carinho que transbordava e eles eram a síntese do amor pra mim. Eles ficaram 6 anos sem filhos e eu e meu irmão éramos  o "test drive" deles. Dela eu ganhei meu primeiro sutiã, foi pra ela que corri quando notei que sangrava e sujava o banco da bicicleta. Praticamente todos os dias ela fazia pão pro café da tarde e quando dava 17:00hs, de banho tomado ficávamos esperando meu tio chegar da Marinha. Quando ele tinha que "dar serviço" e dormir no quartel eu ia dormir com ela pra ela não se sentir só. Aprendi a cozinhar com ela !! Foi ela quem me explicou que  não pode mexer o arroz quando ele tá cozinhando !!kkkkkkkkkkkk Ah! Ela também comentou que o meu primeiro macarrão estava bom mas se eu tivesse feito ele em água fervente ficaria bem melhor !!rsrsrs
Quando eles tiveram a Camilinha foi maravilhoso, eu tinha uma Barbie que se mexia !!! Penso que a Camila foi a criança que mais banho tomou na vida porque eu adorava trocar as roupinhas dela !!kkkkkkkkkkkkkk E tia Branca deixava e ria de tudo que eu fazia.
Quando a Camila tinha uns 5 anos nos mudamos e, como em toda família, sempre tem uma fofoca, ...uma coisa dita atravessada que desfaz a harmonia. Sei que quando a tia engravidou dos gêmeos eu não vi, não acompanhei a gravidez, não vi o enxoval, não lavei as roupinhas com alfazema pra ficarem perfumadas. Meus pais e meus tios estavam afastados por algo que eu desconhecia. Quando soube que os gêmeos nasceram matei aula e fui escondida ver as crianças. A Camila estava na escola, o tio no trabalho e quando nos vimos foi como sempre fora - um transbordamento de carinho. Era um casal Tácio e Talita - o Tácio a cara do meu tio e a Talita a cara da minha tia. Só contei dessa minha visita a pouco tempo e só meu tio sabia que tinha ido ver os gêmeos. Logo depois ele foi transferido pro Rio Grande do Sul.
Quando estávamos morando aqui, a Camilinha já tinha um filhinho - o Miguel - eles vieram aqui passear. Daí pra frente sempre nos falamos por telefone, internet,..de alguma forma.
Dias antes do Natal minha Barbie me falou que a tia Branca não estava bem e eu prometi que iria lá pra dormir com ela como fazia quando criança. Fui dia 13 de dezembro consegui estar com minha tia  dois dias e uma noite.
Naquela noite ela pediu pra ir pro hospital e quando meu tio levantou-a da cama ela disse " Bem, eu te amo. Bem, eu to morrendo". Ela faleceu as 3:45 e meu tio foi pra emergência porque a pressão dele subiu e o coração não ia aguentar.
Era tão difícil ver meu tio desamparado, .... ele tinha perdido a outra parte dele. Ele chorava que apertava meu coração e lá ia eu falando sobre a naturalidade do morrer e da beleza do que eles haviam vivido.
Desde então estamos lutando para tirá-lo da depressão, vou pra lá uma vez por mês e trouxe ele pra cá essa semana. Veio 3ª e voltou 5ª,...mas conseguiu sair de casa. Um passo de casa vez.
Cultivo uma saudade que sei que nunca vai acabar porque parte do que sou foi lapidado por minha tia, por isso não gosto da palavra "finada" parece que a pessoa finda, acaba. Isso não acontece porque a pessoa fica um tantinho em nós.
Tenho um prazer gigantesco por ter tido ela em minha vida e sei que a terei por toda Existência.
Então esse post é mais pra salientar a importância de mantermos nossas relações vivas e em harmonia. A receita de amor que aprendi foi: transbordar em carinho por toda uma vida.

"(...) Faço pensamentos com a recordação do que ela é quando me fala.
E em cada pensamento ela varia de acordo com a sua semelhança.
Amar é pensar.
Eu quase que me esqueço de sentir só de pensar nela. (...)" Fernando Pessoa